A assembleia condominial é o principal fórum de decisão e deliberação dos condôminos sobre temas de interesse coletivo, desde a aprovação de despesas até a definição de normas de convivência. Prevista na legislação condominial e regulamentada pela con-venção e regimento interno de cada condomínio, a assembleia é o mecanismo que garan-te a participação dos condôminos na gestão e administração das áreas e interesses co-muns. Para além da função administrativa, a assembleia fortalece o ambiente democrá-tico, promovendo a transparência e a inclusão de todos os proprietários no processo de tomada de decisões.
Com a evolução das tecnologias de comunicação, surgiram novas modalidades de realização de assembleias, permitindo que os condôminos escolham entre três formas principais: presencial, virtual ou híbrida. A seguir, detalharemos cada uma delas:
1. Assembleia Presencial: Esta é a forma tradicional, na qual os condôminos se reú-nem fisicamente no condomínio ou em um local previamente designado. A pre-sença física permite debates e votações em tempo real, sendo, historicamente, o modelo predominante. Entretanto, assembleias presenciais podem dificultar a participação de condôminos com compromissos que os impeçam de comparecer no local e horário designados, o que pode limitar a representatividade e o alcance da votação.
2. Assembleia Virtual: Com o avanço da tecnologia e a disseminação de platafor-mas de videoconferência, as assembleias virtuais passaram a ser utilizadas em larga escala, principalmente após o contexto pandêmico. Esse formato permite que os condôminos participem das deliberações remotamente, eliminando barrei-ras de tempo e deslocamento. Na assembleia virtual, tanto os debates quanto as votações podem ocorrer por meio de sistemas eletrônicos, proporcionando maior comodidade e flexibilidade de acesso aos condôminos, que podem exercer seu di-reito ao voto de maneira mais ampla e democrática.
3. Assembleia Híbrida: Como uma alternativa que combina os dois formatos anteri-ores, a assembleia híbrida permite a participação tanto presencial quanto virtual. Assim, condôminos que desejem comparecer fisicamente podem fazê-lo, enquan-to aqueles que preferem a participação remota mantêm seu direito garantido. O modelo híbrido agrega flexibilidade, ampliando a inclusão e atendendo a diferen-tes preferências de participação.
Independentemente do formato escolhido, a tecnologia hoje permite que a votação seja realizada de maneira eletrônica, de maneira segura, eficaz e legitima, mesmo após o encerramento da fase de debates e discussões.
Esse procedimento possibilita que, após as considerações e discussões em assem-bleia, os condôminos tenham um prazo adicional para votação, promovendo maior refle-xão e participação.
No presente artigo, discutiremos a possibilidade de estender o período de votação em assembleias virtuais, presenciais e híbridas, abordando a aplicação da figura da “ses-são permanente” conforme disposto no art. 1.353, § 1º do Código Civil.
Analisaremos a possibilidade de que, ainda que a norma limite a sessão permanen-te a temas de quórum qualificado, sua utilização seja estendida para deliberações de quó-rum simples, com vistas a garantir uma maior inclusão e participação democrática dos condôminos.
• Democracia condominial e ampla participação: Um direito de todos
O direito dos condôminos de participar das deliberações condominiais, está dire-tamente associado aos princípios de democracia interna e de transparência nas decisões que afetam a coletividade.
A limitação da extensão de sessões de votação apenas para temas de quórum qua-lificado, como previsto no art. 1.353, § 1º, do Código Civil, embora válida em seu contexto originário, não se justifica diante das possibilidades proporcionadas pela tecnologia, que possibilita a mesma eficácia e inclusão para qualquer tipo de deliberação.
A crescente adesão aos meios virtuais para realização de assembleias condomini-ais traz à tona a necessidade de interpretar o regramento civil em conjunto com a dinâ-mica condominial e a legislação vigente, visando a garantia da participação efetiva dos condôminos e da transparência no processo decisório. Neste artigo, analisaremos a reali-zação de assembleia, na qual os debates são realizados em uma sessão e a votação es-tendida por até três dias após a finalização do debate, considerando a figura da “sessão permanente” estabelecida no art. 1.353, § 1º do Código Civil.
• Análise do contexto normativo e da assembleia em sessão permanente
O Código Civil, em seu art. 1.353, § 1º, traz o conceito de “sessão permanente” no contexto condominial, permitindo a continuidade das deliberações para casos em que o quórum necessário de aprovação não seja alcançado. A norma é direcionada, especial-mente, a decisões que demandem quórum qualificado, como alteração da convenção de fachada, de forma a evitar que a falta de presença prejudique deliberações essenciais.
Entretanto, nossa análise se concentrará na hipotese da assembleia que discuta temas com quórum de maioria simples, sem exigência de quórum qualificado. Isso leva à questão: seria lícito estender a votação por três dias após a finalização da sessão de de-bates, tratando-a como uma espécie de “sessão permanente”, ainda que para decisões de quórum ordinário?
Embora o conceito de “sessão permanente” esteja atrelado a votações de quórum qualificado, sua aplicação pode ser ampliada quando fundamentada no princípio da parti-cipação democrática e na efetiva lisura do processo decisório condominial.
Neste caso, a proposta de estender a votação por três dias visa não apenas a obten-ção de um maior quórum, mas a possibilidade de maior participação dos condôminos, independente da matéria discutida.
Sob essa ótica, a prática atende aos objetivos de fortalecimento democrático e à conveniência de debates abrangentes, proporcionados pelo ambiente virtual, o que é uma inovação frente às limitações das assembleias presenciais.
Nesse sentido, restringir a sessão permanente apenas a decisões que demandam quórum qualificado fere o princípio de igualdade entre condôminos, pois implica que so-mente em questões mais complexas a participação ampliada e o tempo adicional de re-flexão seriam concedidos.
Entretanto, a realidade condominial demonstra que até mesmo decisões de maioria simples, que afetam diretamente o dia a dia e o orçamento dos condôminos, merecem uma análise democrática equivalente.
Permitir que os condôminos tenham mais tempo para refletir e votar, independen-temente do quórum exigido, fortalece a governança condominial e previne a tomada de decisões por um grupo restrito, muitas vezes em prejuízo da coletividade.
A extensão do período de votação para três dias após o encerramento dos debates, ainda que para temas de maioria simples, permite uma deliberação mais refletida e am-plia o acesso dos condôminos, especialmente daqueles que, por compromissos pessoais ou profissionais, não conseguem participar ativamente da sessão em tempo real.
A ampliação do período de votação é, portanto, não apenas um mecanismo de in-clusão, mas também um instrumento de valorização da participação democrática, ali-nhado aos princípios de transparência e legitimidade no processo decisório condominial. Esse modelo contribui para evitar que decisões de grande impacto sejam determinadas por um grupo reduzido de participantes, em detrimento dos interesses coletivos e da saú-de democrática do condomínio.
A aplicação restritiva do art. 1.353, § 1º do Código Civil, ao limitar a sessão perma-nente a deliberações de quórum qualificado, desconsidera que, no ambiente condominial, as decisões de maioria simples também possuem impactos significativos e demandam ampla participação.
Questões relacionadas a eleição de síndico, o uso das áreas comuns, ao orçamento e valor da quota condominial, à prestação de contas, serviços e à definição de normas internas, embora decididas por maioria simples, afetam diretamente a convivência e o patrimônio dos condôminos.
Ampliar a extensão da votação para essas deliberações não compromete a legali-dade, mas sim fortalece o objetivo central da democracia condominial: assegurar que todos os condôminos possam exercer o direito ao voto de forma efetiva, informada e livre de pressões temporais. Isso é particularmente relevante em assembleias virtuais, onde a própria tecnologia permite uma flexibilização temporal sem prejuízo à lisura do processo.
Embora a extensão da votação para temas de quórum simples possa suscitar ques-tionamentos, a prática ganha legitimidade quando realizada de maneira clara, informada, e sem que haja vedação na convenção condominial, e com o prévio conhecimento dos condôminos, como descrito no edital de convocação, respeitadas portanto as regras con-tidas no art. 1.354-A do Codigo Civil.
A ausência de previsão expressa para votação estendida nas assembleias que dis-cutam temas de quórum simples, longe de impedir a prática, abre margem para uma in-terpretação em prol da democracia e da ampla participação, respeitando o interesse co-letivo.
Para mitigar possíveis impugnações, recomenda-se que o condomínio faça constar no próprio edital a forma e periodo da votação, e deixe explicito na própria assembleia a forma de votação e período, atendendo ao disposto no art. 1.354-A do Codigo Civil, desta-cando que o formato visa a inclusão e transparência, sem distinção entre temas de quó-rum qualificado e quórum simples. Este procedimento preventivo protege a validade das deliberações e assegura a segurança jurídica para todas as decisões tomadas sob esse formato, promovendo a regularidade e o consenso entre os condôminos.
• Conclusão
A extensão do periodo de votação eletronica, em assembleias em condominios pa-ra deliberações que exijam quórum de maioria simples, atende ao princípio da participa-ção democrática e fortalece a governança condominial.
Permitir que todos os condôminos, inclusive os que enfrentam limitações tempo-rais, tenham igual acesso às decisões do condomínio assegura uma gestão mais justa, transparente e legítima. Ao estender a prática da sessão permanente para temas de quó-rum simples, respeita-se o espírito do art. 1.353, § 1º, que preza pela representatividade e pelo direito dos condôminos de participar plenamente das decisões que afetam seu pa-trimônio e convivência.
ÁTILA MELO SILVA
Advogado – Especialista em direito condominial